Andava eu a tentar comer literatura francesa,
existencialismo em duas frentes,
Fazer de mim um aldeão culto, que não sabe sequer quando se
plantam batatas,
Desafiando professores com experiências comprovadas na
cabana,
Onde ainda se podia encontrar a curiosidade dos alquimistas
e o cheiro
A enxofre entranhava-se nas raízes do cabelo, e nos ossos
dos animais
Encontrados mortos no monte, desistia já de encontrar a
teoria de tudo,
Tinha embirrado com a matemática e via que das minhas mãos
nunca
Sairia nada melhor que as punhetas que batia abençoadas
pelas senhoras
Do baralho de cartas da loja dos trezentos, e tu, tu já mais
poeta que eu
Alguma vez serei, tu que já sabias tocar as cordas da perversão
dos
Animais que são todos os homens, eu ainda acreditava que
cada batida
Me aproximava mais do inferno, recolhia dinheiro na missa,
Lia Nietzsche às escondidas em casa do padre, onde havia
imensos álbuns
De música clássica e televisão por cabo, e tu a incendiar
vontades
À distância, eu quanto muito, escrevia mensagens quando os
meus
Amigos queriam mostrar-se românticos a quem queriam foder,
Contudo, apesar das longas tardes à beira do rio no Verão,
Na companhia do Hemingway, à noite sentava-me nas escadas
Do avô morto com os primórdios da barba molhados pelo
primeiro grelo
E tu, apenas com palavras, a marcar mais fundo, que aquelas
primeiras
Cuecas que despi, ainda hoje me fascina mais aquele
movimento
Que a morte, a revelação, a aparição, tu, longe, latente,
Gloriosa em toda a tua inocência perversa, enfant terrible,
Ainda nos dedos o cheiro da professora da mesma escola
E nós lado a lado, com uma fome adiada, lembras-te.
21.03.2015
Turku
João Bosco da Silva
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